Vinte e três horas e não consigo dormir.
Essa segunda-feira parecia ser
o mais normal dos dias. Uma reunião pela manhã, uma tarde e outra a noite.
Minha mesa abarrotada de papeis para analisar.
al do dia, antes da
última reunião, ao passar pelo banheiro, o espelho refletiu: como passar outro
dia de trabalho com um cabelo desse? Ninguém merece... O que eu preciso pra
passar mais de treze horas trabalhando? Apenas umas boas horas de sono e um
cabelo arrumado. Só isso. É só isso que eu preciso.
É inimaginável que um desejo
tão simples possa ser tão difícil de ser realizado. A pessoa mora no CAUB I, longe
de tudo; na manhã do dia seguinte tem que estar cedo na regional; meu amigo
Leonardo (o cabeleireiro) foi visitar o pai e ainda não voltou. Sintetizo a
situação para a Renatinha:
- Com esse cabelo nem saio de
casa amanhã! Posso até pensar em pular de um pé de alface. É desesperador!
Renatinha sempre tem solução
pra tudo. Rapidamente pega o telefone e solicita à sua amiga Socorro que me
atenda ainda naquela hora, às 18h 30min.
Vou com aquela desconfiança.
Não vai dar certo. Ninguém além do Leonardo consegue domar esse leão. O pixaim
vai ficar mais seco do que nunca. Mas, que alternativa eu tinha?
Em meio aos procedimentos de
lavagem, rápida hidratação, levanta daqui, senta ali, uma menina saltita pelo
salão, de uniforme de uma Escola Classe do Núcleo Bandeirante. Ela auxilia as
tias, com um inseparável livro nas mãos:
_ Esta estória é muito legal!
Eu demonstro interesse:
_ Qual o nome do livro?
Ele responde. Eu nem me lembro
mais o título. Não me esqueço é da estória, não me esqueço é da menininha de
uniforme. Ele senta em minha frente:
_ Vou ler uma parte pra você.
Filomena... era o nome da minha
vó paterna, nem tive tempo de contar isso à menininha. Mas... Filomena era
costureira, fazia vestidos de noivas.
_ Não. Vou começar a leitura do
início pra você.
E a estória de Filomena foi se
desenhando em minha frente por meio das palavras lidas por aquela menininha.
Que encanto! A costureira
Filomena, seu vestidos, seu noivo que fugiu de moto e aquela menininha.
Socorro terminou a escova,
passou a chapinha em todo o cabelo, mas, na aquela altura já não me preocupava
mais se o pixaim estava ressecado. Só queria saber que final fora reservado à
Filomena e de não decepcionar minha contadora de estórias.
As cabeleleiras pegam suas
bolsas, o moço do caixa puxa a porta da loja, mas a menininha não se importava
com o movimento, a vida de Filomena era muito mais importante.
Só quando o drama de Filomena
se resolveu é que paguei a conta da escovinha, 25 reais. Agradeci a menininha
pela estória, agradeci a Socorro pela escovinha e fui para minha terceira
reunião.E agora, como dormir? Não tem jeito. Tinha que registrar a emoção da
estória da Filomena lida por uma menininha de uniforme. E eu que procurava
apenas uma escovinha...
GEDILENE LUSTOSA
GEDILENE LUSTOSA
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